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sábado, 6 de novembro de 2010

Idade média

A idade e o tempo deitam-se na mesma água
E acordam longe de tudo o que faz o encanto
De dois rios que se atravessam
Seguindo em direcções diferentes
A caminho do mesmo espanto
Cada vez mais distantes
As idades iniciais
Médias
Finais
São tão diferentes disso
Que as acho iguais.


segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Este morto



Os milénios os séculos as décadas
Os anos os meses os dias as horas
São tão dignos de atenção
Que não temos vida para compreender
O tempo que vivemos
Este morto
Já não vive
Já não lhe digo tu
Não deixes que te matem
O sol e o mar ao largo
Vemos
Deste cemitério
De uma das mais de cem
Cidades
Sempre nos perdemos
Como perde quem
É a ponte mas não sabe
Entre eras e idades
Este morto
Não fala
Fria fronte
Face desentendida
Já não lhe dizem tu
O destino
A nós se reserva.


sexta-feira, 29 de outubro de 2010

O silêncio debaixo da touca



À porta do palácio
Já todos foram
No amplo redor
Estremece
Não ter alma
Passado
O tumulto
A paz
Jorros de verão
De água
Eva e o paraíso.

domingo, 17 de outubro de 2010

Os teus pecados


Olhas para o espelho e não encontras 
um rosto
o que vês não é o reflexo 
do que conheces
o espelho é uma porta 
aberta para a eternidade
a entrada interdita 
à luz dos olhos
não estavas à espera 
que um espelho fosse
um pensamento 
que podes estilhaçar
mas não consegues 
desarmadilhar
embora penses que há-de haver uma chave
para compreenderes 
o que pode acontecer de mal
a um homem bom
a verdade não tem fechadura.



quarta-feira, 13 de outubro de 2010

Os meus poemas

Os meus poemas nem sempre iluminam
Nem sempre obscurecem
Os meus passos
Nem sempre sobem
Nem sempre descem
Escarpas
Escadas
A minha imaginação
Nem sempre se perde
Nem sempre me perde
Atalhos
O meu mundo nem sempre aparece
Nem sempre o reconheço
Recônditos de asas
Repouso
Um pouco por toda a parte
O meu diário nem sempre é aquilo
Em que escrevo
Nem sempre escrito
Nem sempre apagado
A minha aventura nem sempre no espaço
Poemas atraem
O futuro
O seu calor nem sempre mata
Ilha
No crepúsculo
Nem sempre
A montanha
Atrás de outra
Nem sempre perdi o cavalo
Nem sempre ouvi
Uivos.

domingo, 10 de outubro de 2010

Canção do tempo perdido


Hoje acordei de manhã
E acordei bem
A última é a melhor
Se não for a que lá vem

Canto para quem não está
e não canto para ninguém
Para cantar não é preciso
Mais do que a voz que se tem

Palavras leva-as o vento
Se a memória o deixar
Que nem tudo o tempo leva
Nem tudo há-de levar

Canção do tempo perdido
Não te percas a escutar
Se não tiveres ouvido
Para as horas a passar.



domingo, 3 de outubro de 2010

Agora dava-me jeito

Agora dava-me jeito escrever um poema
Preferencialmente o poema que toda a gente
Gostaria de ter escrito
E dava-me jeito sentir um grande amor
Pela humanidade
Preferencialmente pelo desgraçado
Que perdeu tudo o que ganhou com o suor
De uma vida de trabalhos honestos
Para financiar uma guerra de mafiosos
Extorcionistas

Dava-me jeito sentir que sou um herói
Na luta contra o mal e o terror
Dava-me jeito não sentir esta dor
Que dói
Porque nada sinto

Dava-me jeito sentir o que penso
E escrever o que sinto
Mas só penso o que sinto 
E não sinto o que minto.



segunda-feira, 27 de setembro de 2010

A Poesia e os malfeitores

Onde medra a anomia
É farta a vilanagem
O que não é feito com arte
Não é bem feito
Onde há arte
Há poesia
Não há crime perfeito
E se existisse
A arte não seria
A puta
Que o parisse
Se a arte tem defeito
Ainda ninguém o disse.