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quinta-feira, 27 de abril de 2023

O que resta

Se estas ruínas

aliás belas

aliás monumentais

são o que resta

daquilo por que viveste

e por que tanto lutaste

com seriedade

que ao menos pudesses

ter tido a antevisão inefável

do que agora aos nossos olhos

é um desfecho desolador

de tantas vidas escarnecidas

hipotecadas à transcendência

daquele castelo mutilado

outrora altivo

e daquela igreja irreconhecível

outrora preservada

sem que ao menos

soubéssemos um pouco

da história de uma delas

podia ser até da mais humilde

das contingências de uma vida

vivida nestes penhascos

tão acabrunhados

podia ser até da última pessoa

a fechar os olhos à história

a toda a grandeza

de que não se ouve

sequer em memória

uma voz

sequer ilusória

a sair destas ruínas colossais

por onde agora só

alguma sombra de nuvem passa

e não deixa rasto.

 

sábado, 22 de abril de 2023

Não eram ilusões


Não eram ilusões

eram sonhos

necessidades bem reais

dores e angústias

frustrações de ideais

batalhas cruéis

fantasias

que podiam ser fatais

paixões que cortavam

visões carnais

que importavam tanto

por serem apostas totais

sem suspeitas de que aí

a sabedoria

não era mais.


sábado, 8 de abril de 2023

A poesia


No fim só

vi farrapos e não bandeiras

 

orações que agitei

a todos os deuses garantes

da minha ingenuidade

de os ter pela arreata

dos meus caprichos

 

foi isso que em sonhos

antegozava infantilmente

 

que mais dizer

daquilo que me fez sentir

a falta

do que menos tive

quanto mais desejei?

 

E como compreender

que gosto de ter sido o autor

desse mundo impossuído?

 

E como saber

(se o não sei)

porque fui banido

por tudo aquilo em que acreditei?

 

No fim

a poesia

é o único tecido

a adejar

minha companheira

de que faço bandeira

por o ter sido.