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sábado, 28 de março de 2020

Aquilo em que as sociedades humanas apostam em transformar as pessoas.


Se me dessem a escolher (se me fosse dado ou me tivessem dado a escolher), se houvesse verdadeiras alternativas à cultura da civilização à força, da liberdade de modelo único de organização política e económica e religiosa (todas as religiões são iguais, todos os partidos são iguais, todas as escolas são iguais...) eu teria escolhido não ter nada disso, teria escolhido ser selvagem e é a dor e a tristeza irremediável de nunca o ter podido ser, de me terem roubado a liberdade, de me terem sequestrado e raptado para as teias e para as celas e para os relógios e para os grilhões dos guardas omnipresentes, completamente domado, como um burro, ou um escravo, que ainda é acusado de ser escravo de si mesmo, obrigado a assistir ao filme interminável do seu triste filme, como se a sobrevivência fosse uma epopeia gloriosa, não sua, mas dessa tal civilização à força, que preconiza a liberdade... é a dor e a tristeza de nunca ter podido ser selvagem, dizia, que me impede de acreditar naquilo em que as sociedades humanas apostam em transformar as pessoas.


segunda-feira, 23 de março de 2020

As equações e o sinal =

A discussão sobre o conhecimento e sobre a linguagem, sobre as humanidades, as artes, as expressões, as ciências...não pode ignorar a ciência feita sobre essa mesma discussão e que é uma vasta filosofia, no melhor sentido da palavra, considerando as duas vertentes privilegiadas de produção de conhecimento, a dedução, a partir do que se conhece e a indução, partindo de hipóteses...
As equações são um bom ponto de partida para pensarmos na consistência dos nossos conhecimentos, sejam eles mais matemáticos ou menos. 
No fundo, estamos constantemente a equacionar e a procurar resolver equações. 
Neste pormenor, o que me parece distinguir mais as ciências, o conhecimento científico, das outras modalidades de conhecimento, competências, respostas, comportamentos, é sobretudo o modo e a linguagem em que equacionam os problemas e o modo e a linguagem em que resolvem, quando resolvem, as equações.
Todos nós passamos os dias a equacionar e a resolver equações e deitamo-nos com as equações, acordamos com elas e não nos livramos delas. 
Quando resolvemos umas, logo emergem outras e isto tanto acontece na música, como nas línguas, como na pintura, na moral, ou na religião...
Na matemática, as equações, tanto quanto sei, são da ordem numérica, do mais, do menos, da multiplicação, da divisão, da proporção, da progressão, regressão, finito, infinito, etc., e o significado, muitas vezes, depende de algum atributo dos números, como, por exemplo, "3000 mortos", em que mortos é decisivo no significado.

sexta-feira, 20 de março de 2020

Entrincheirados


Nas últimas semanas, à defesa do covid.19, nesta guerra de trincheiras, que muitos dariam por ultrapassada, sobretudo depois do imenso sucesso do poder militar aéreo, o inimigo é mais insidioso e diabólico do que nunca.
É um inimigo que faz parar os aviões e guardar os mísseis e todos os arsenais de torpedeiros e manda as pessoas para os abrigos, mesmo sem bombardeamentos, submissas e abatidas.
Em vez de activar a economia, numa corrida para as fábricas de armamento, tanques e equipamentos...para-a, afunda-a.
Em vez de obrigar a mobilizar tropa rija e violenta, obriga a cuidados paliativos e, tragédia das tragédias para quem é senhor da guerra, é um inimigo que escolhe o campo de batalha e as armas e move-se à vontade, ataca em qualquer lugar, a qualquer hora, invisível aos radares e sem estrondo, inexpugnável e impune.
Um inimigo cobarde. Um terrorista da pior espécie. Desconhecido. Destituído de intenções. Um facto e não actos. Ao contrário de uma guerra.
Guerra é o que vamos ter de lhe mover. Guerra é coisa de humanos.

sexta-feira, 13 de março de 2020

Ainda podes ser acusado de não teres nada

Na realidade, o problema da burocracia, da corrupção, do nepotismo, dos compadrios, dos complôs, das arbitrariedades do poder e todo o tipo de abuso, é que, apesar das queixas gritantes e embora plenas de razão, os cidadãos não são tidos em conta senão para obedecer, trabalhar, votar e respeitar a estrutura política que são obrigados a pagar, sem escolha.
E quando alguém apresenta alternativas e soluções para os problemas é visto e considerado como uma ameaça. Logo tratam de ignorar ou desdenhar para não terem de reconhecer que muito pode e deve ser feito para bem de todos (excepto daqueles que deixariam de ter as vantagens que indevidamente têm).
Não falta quem seja capaz de revolucionar com melhores leis e procedimentos e práticas. Não falta quem tenha competência para fazer melhor do que aquilo a que temos assistido (pior era difícil).
O problema, insisto, é que ter razão é pouco e pode ser nada.
Aqueles de quem nos queixamos, com razão, não têm razão mas têm e fazem o que querem.
Os outros, aqueles que têm alternativas e soluções, com razão, só têm isso, não têm o poder.
E podem até estar cansados de ter razão, ao ponto de já não terem vontade, nem determinação para a acção.
É preocupante e alarmante que o poder da razão continue a ser vilmente (para não dizer democraticamente) derrotado e suplantado pelas razões da força.
Mesmo quando tens razão, se não tiveres algo mais, ainda podes ser acusado de não teres nada.

quinta-feira, 5 de março de 2020

O que são direitos? Sentem-lhes o cheiro?

"Quando concretizamos direitos, damos um sentido à tragédia humana e à nossa própria existência!

O direito e a arte são as únicas evidências de que a odisseia terrena teve algum significado!”

                                             Não resisti a publicitar este texto da Juíza Federal Raquel Domingues do Amaral.