I
Quando a dor se instala como hóspede antigo
e o mundo se fecha em silêncios densos
há uma faísca que sem pedir abrigo
acende o invisível
nos nossos pensamentos
II
Não é redenção nem milagre divino
é o lume discreto que o corpo conhece
a beleza da vida como peregrino
vem e vai até que
nos esquece
III
Ela não mora em nós nem nos visita
pousando leve num ramo ferido
mas parte deixando escrita
a memória do instante em que fez sentido
IV
A escuridão que já não é castigo
mas a cera da luz que há de vir
porque se aprende com o inimigo
é arte secreta de não
desistir
V
Quem sente a beleza mesmo por instantes
carrega no peito um sol clandestino
que brilha às vezes um pouco antes
de vencer as trevas do mundo sibilino.