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sexta-feira, 7 de fevereiro de 2020

A Escola é um bicho de sete cabeças

A Escola é e pode ser muito mais do que um instrumento de socialização programado, porque é investimento, ordenamento e controlo social e sistema institucionalizado de (des)classificação social, que tende a normalizar as ignorâncias instituídas e a promover os interesses reinantes, numa espécie de círculo vicioso.
Na sociedade tudo funciona. Funciona a ditadura, a democracia, o totalitarismo, a escravatura, o liberalismo, a república, a monarquia, o capitalismo, o socialismo...O cristianismo, o ateísmo...
Não nos deixemos enganar pelo critério da eficiência como boa racionalidade.
A eficiência pode ser obtida à custa de muitas coisas bem mais importantes.
Se a Escola não fosse obrigatória e não fosse Pública, as questões eram outras.
No caso da Escola obrigatória e Pública, compete ao Estado o discernimento, clarividência, bom senso e justiça de cuidar de um bem comum que é muito mais do que um instrumento de ordenamento da sociedade, com o séquito usual de sanções positivas e negativas e consequentes injustiças.
A Escola, como representante do saber e do conhecimento, gera expectativas muito elevadas, demasiado elevadas, mas tem de saber muitas coisas e uma delas é saber ser solução e saber não ser problema para os alunos e professores.
A Escola, em Portugal, ainda é um bicho de sete cabeças para toda a gente, menos para os políticos, que a resumem a um problema de números de orçamento, a eventuais prescrições económicas e a algumas más memórias suas.
Mas a Escola não pode ser aquele labirinto onde os teus pais te abandonam, fecham a porta e nunca mais encontras a saída e não te encontram, ou, por diversas razões, encontras a saída ou te encontram.
A Escola não pode, simplesmente, forçar o aluno a deslocar a sua atenção de si mesmo, dos seus problemas individuais, pessoais, e esperar que se dedique, abnegadamente, aos problemas da sociedade, como um sacerdote, sem uma razão convincente dessa abnegação (na perspectiva dele e não da sociedade)...
A Escola não pode ser o protótipo da Casa dos Problemas e dos Terrores, sem presente, onde tens de entrar no futuro ou no passado e onde tudo soa a ameaça e a fim do mundo, ou a depressiva e culpabilizante retrospectiva de uma História da humanidade, de horrores, infâmia, violência e destruição.
De cada vez que se introduz um novo projecto, seja de saúde, de sexualidade, de sustentabilidade ambiental ou de direitos humanos conexos, a advertência é grave e as perspectivas não são animadoras.
A Escola não é não será o paraíso dos crânios ermos, mas tem de ser mais do que o inferno ou o purgatório das jovens almas censuradas.
A Escola pode ter de ser subversiva para continuar a ser Escola.
E tem de ser diversa como diversos são os alunos e os professores.
Realista, para os alunos e os professores que existem.
A Escola não pode contar com um ideal de aluno e um ideal de professor, por mais perfis que se façam.
Os políticos da educação e os diretores das escolas deviam, obrigatoriamente, dar aulas, nem que fosse a uma turma e, de preferência, a que estivesse sinalizada como mais problemática.
De resto, para abreviar, premiar os alunos bem classificados e punir os mal classificados, em âmbito de escolaridade, parece-me um mau princípio.
O valor das classificações, para todos os efeitos e mais algum, está longe de corresponder ao interesse e ao valor das aprendizagens, para já não falar dos saberes e das competências e, mais ainda, do mérito e das realizações/reconhecimentos sociais e profissionais.
A Escola não pode ser, não deve ser, nem para alunos, nem para professores, mais labirinto do que a vida já é.