A nossa relação com o tempo é tão importante que, muito mais tarde, podemos entender que o presente é o lugar de quase todos os futuros que não
aconteceram e que isso pode não significar algo que devamos lamentar.
Este tema é dos mais promissores para quem aborde a psicologia individual na perspetiva do próprio indivíduo, mais do que na
perspetiva do que seja uma psicologia, geral e abstrata.
O modo como cada um vive, ainda que se não dê conta, voltado para o passado, criando narrativas, ou projetado para o futuro, criando narrativas, é
um modo de viver o presente.
O importante não é ter consciência de que se vive numa ilusão, é ter consciência de que esse modo de viver funciona.
Nem todas as ilusões são
convenientes e algumas são desastrosas.
A nossa relação com o tempo é delicada e exigente do ponto de vista das contrapartidas. Sempre que tentamos enganar o tempo, fugir ao tempo, passar tempo,
perder tempo, ganhar tempo, lutar contra o tempo, estamos em conflito com alguma realidade que nos ultrapassa e preferimos tentar ignorar.
O tempo não é nosso, apenas nosso.
O meu tempo e o teu tempo não
são o nosso tempo.
Cada indivíduo vive, irremediavelmente, num tempo que é, simultaneamente, seu e de ninguém.
A ilusão a que me referi acima desempenha aqui o papel crucial de nos fazer
acreditar que o meu tempo, o teu tempo, o tempo dos outros, é o nosso tempo.
Carlos Ricardo Soares