Linhas de orientação
Na linha do que disseste
Não são linhas ténues
À volta da fogueira
Ou dos vigilantes do museu
Que ninguém conhece
Porque não há intérpretes
Privilegiados
Que se aproximem o necessário
E o suficiente
Do que não foi feito para eles
Cada vez mais sós
Os que estão sós
Os que não têm ninguém
Que os defina
Por não estarem ligados
A nenhuma mágoa encantadora
A alguém
Que os mata
De um mundo morto
Ou agonizante
Aparte póstumo
Testemunho que sobra
Sem remédio
Porque nada diz
E nada retira ao que disse
Que nunca se perdeu
Nas distrações felizes
Do acaso
Num teatro humano
E tempo desumano
De caça ociosa
Como modo subtil de vida
E de liberdade
Como se aí estivesse a razão
E o ser absorvido na difusão
Dos lugares e das obras
Presenças e fugas
Preponderantes
Da posse da própria vida
Afeições de versos e deriva
Destino abandonado ao jogo
Que o destino é de aparências
Inquietações de poeta
Impressões de vagabundo
Que separa junta e aproxima
Eroticamente
Aberturas de fuga ilusória
E de gozo
Entre objetos e sentidos simultâneos
Quando a melodia e o baile
Bem poderiam ser reais
Se a morte não fosse mais
Do que a mortalidade
Uma obscuridade
Embrulhada em suspiros
Impossíveis desabafos
Chamar liberdade ou amor
À perdição
Poemas sem juízo
Rosas em silêncio no tumulto
Dos lábios
Dedos sobre as cordas
De um instrumento de feições
De alegria de fantasmas
Louca e fugaz como a fala
Que contrabandeia literatura
Como forma de prazer
Sem compromisso
E sem mais intimidade
Que a decisiva
Como se houvesse lugares
Essenciais
Por serem interditos
Nada é mais belo
Do que escapar
Aos significados de uma vida
Sem paz
De densidades insolventes
De pedras que crescem
Como se os cristais uivassem
Quem somos
Ou dores enraizassem mais fundo
Que o sentimento de resgate
De nós
Não apenas sós
Os que estando sós
Não são ninguém
Como nós.
Carlos Ricardo Soares