A parte mais resistente para quem se afoita a penetrar e a pensar e a reflectir e a falar sobre a sociedade e a cultura é quando se percebe que, afinal, não temos alternativas a viver, pensar e a expressarmo-nos senão enquanto ficções, até de nós próprios.
Mesmo quando estamos conscientes disso e entendemos as coisas dentro do seu universo de significações, não nos resta senão viver de acordo com isso.
Se um autor, por exemplo, quiser ficcionar um universo paralelo, não consegue.
É tão ou mais difícil do que falar de um mundo sem metafísica e alquimia cujas linguagens e conceitos são da metafísica e da alquimia.
É tão problemático como tentar explicar que "Deus morreu" a uma multidão que, logo, reclama pelo cadáver, que têm como certo não ser possível exumar, e não ser essa a tarefa.
Na relação sujeito-objecto, o objecto passou a integrar o próprio sujeito como parte do problema, senão a maior parte.
E existem muitos riscos de comprarmos, ou de adoptarmos ficções que, de todo, não nos convêm.
Nem só os charlatães, bruxos e bruxas, sequestram os seus clientes com o poder das ficções que, habilmente, tecem para eles, fazendo-os crer que a teia existe.