segunda-feira, 30 de janeiro de 2023
Aprender a agir a pensar e a sentir
sexta-feira, 27 de janeiro de 2023
A talho de foice
Como já escrevi noutros espaços, e aqui a talho de foice, a incompetência dos governantes é tão gritante que corremos o
risco de desordem geral e alienada. Talvez isso ainda não tenha acontecido, mercê das estruturas institucionais que, em vez de maldizerem os ventos, fazem velas e as colocam a jeito, para disso beneficiarem.
O
que para uns é uma maldição, para outros é uma bênção. O governo não precisa de fazer acrobacias para atingir certos fins, como, por exemplo, desamparar a escola pública.
Basta-lhe fazer o que está a fazer para que as escolas privadas vejam aumentar significativamente a procura.
Mas o governo não tem o direito de provocar, seja com a sua ação, seja com a sua
inércia, determinados efeitos, contra uma vontade democrática não despicienda e, menos ainda, contra o interesse público e, sobretudo, contra a razão. Uma das posições reiteradamente
assumidas, há décadas, pelo Governo, tem sido estrangular as despesas públicas onde isso é menos problemático: na educação.
Fazer greve na Educação parece
ser tão vantajoso para os cofres do Estado que até dá a sensação de que as greves são bem-vindas. Os alunos e os pais já perceberam que o Estado tem outras prioridades. Aliás,
sempre que é preciso, não digo necessário, fazer austeridade, a receita está à mão e nem é preciso inovar: cortes na educação. A educação, a investigação,
a ciência, a cultura, em geral, parece que não lhes são imprescindíveis.
Afinal, até poderíamos dizer que durante séculos se viveu sem a educação que temos
e sem alfabetização. Mas a principal razão não é essa, é que aí podem meter a mão à vontade, que não lhes acontece nada (pensam eles, que não têm
respeito pela educação, nem a valorizam minimamente).
Onde eu queria chegar, e já me fui desviando para outros planos, era à questão da razão, indissociável da questão
do interesse público, mas este, infelizmente para os professores, não é entendido pelos governantes como algo que envolva seriamente a Educação. Este desprezo seria igual a tantas outras
formas de desprezo que se ignoram, ou de que se faz vista grossa, se não fosse ultrajante e ofensivo dos genuínos interesses dos professores, alunos e famílias e, por extensão, do interesse público
e do país. Basta pensar no caso do congelamento do tempo de serviço para constatarmos a inépcia dos sucessivos “ilusionistas” que têm passado pela pasta da Educação.
Neste
momento, em que o descongelamento ainda interessa a alguns profissionais, nomeadamente professores, o descongelamento já não aproveitaria a uma boa parte daqueles que viram a sua progressão suspensa. Por
outro lado, o que perderam com o descongelamento, ou o que deixaram de usufruir, mesmo que, agora, lhes fosse contado esse tempo, ficaria irrecuperável, ou seja, a contagem para o futuro não lhes restituiria
o que deixaram de receber todos os anos em que estiveram congelados.
De resto, e para não me alongar demasiado sobre um assunto que é muito aborrecido, sobretudo para os professores prejudicados, quando
os sucessivos governos, em vez de apresentarem argumentos atendíveis e razoáveis para a sua intransigência generalizada, tentam justificar a sua recusa em satisfazer todas as reivindicações,
em bloco, com a alegada falta de verbas orçamentais, não é crível que estejam à espera de que se lhes reconheça razão, a não ser que eles sejam mesmo ineptos.
sábado, 21 de janeiro de 2023
O cais de embarque
Oh vertigem que paira
Vista daqui a tarde é imensa
E desvaira
De tão inclinada para a rua
Agora deserta
A descer para o cais
Tão habitada de saudade
Que até o silêncio aperta
A sombra ali se adensa
E invade
O cais de embarque
Antiga porta da cidade
Foi daqui que o povo alçou o olhar
Para o esplêndido horizonte
Em barcos à descoberta
Podemos agora dizer
Como é pungente
Estar a ver que partiram
Deixando para trás este lugar
Que em memória deles
Outros tornaram
Doloroso imaginar
Como agora é não poder
Entrar
Na inconcebível catedral da noite
Com os ventos a soprar.
quarta-feira, 11 de janeiro de 2023
Falar de justiça fazer justiça
A justiça, como muito bem viu Aristóteles, é, não apenas uma função judicial do Estado, que compete aos juízes, mas está pressuposta e é indissociável tanto das funções legislativas, quanto das funções executivas, políticas ou administrativas do Estado. Digamos que o Estado, em todas as funções que exerce está obrigado a proceder com justiça.
A identificação da justiça com a observância e a aplicação da lei é muito redutora, porquanto as leis podem ser injustas e mesmo as leis justas, ao serem aplicadas de modo não uniforme, geram injustiças.
As leis são instrumentos normativos que servem, em geral, para realizar a justiça. Estou a pensar, por exemplo, que a justiça é entendida e aceite principalmente como a aplicação da lei a todos por igual, tratando as situações semelhantes de idêntico modo.
Ao longo da história, parece-me que os humanos foram discutindo e resolvendo o problema tentando que o legislador e o aplicador da lei estivessem igualmente sob a sua alçada. É relativamente fácil aceitar uma lei que a todos se aplica, incluindo quem a faz e a impõe. Mas já é extremamente difícil aceitar uma lei que, por exemplo, onera os súbditos com a obrigação do seu cumprimento e não obriga igualmente quem a faz assim se colocando fora, ou acima da lei.
Com a emergência do Estado-de-Direito-Democrático, a ideia de Direito ganhou protagonismo, não apenas no plano teórico dos princípios, como princípio normativo de toda a intenção e atividade legislativa, mormente estadual.
Se, efetivamente, a feitura das leis e a sua aplicação observarem, tanto quanto possível, a ideia de Direito, como a resposta e a solução reta, justa, ético-axiologicamente fundada, que deve ser realizada, no respeito e entendimento dos legítimos poderes para a materializarem, diria que dificilmente encontraríamos razões para nos queixarmos das leis. Neste caso, seria ainda muito importante, para evitar injustiças, que, na sua aplicação, não houvesse desvirtuamento da sua letra e do seu espírito, entendido à luz da ideia de Direito e dos princípios gerais do sistema jurídico.
Em muitas situações são os juízes a suprir as lacunas da lei e fazem a justiça, não segundo as leis, porque existe uma lacuna, mas tentando seguir aqueles princípios.
Mas deixo a pergunta: poderá haver uma lei injusta que se aplique igualmente a todos, sem exceção?
sábado, 7 de janeiro de 2023
Somos racionais e daí?
Toda a análise, comentário, interpretação, conhecimento, opinião que se faça, incluindo a crítica da (ir)racionalidade humana, ou a defesa de algum tipo de irracionalidade, ou o reconhecimento de que a racionalidade humana é uma faculdade humana que não deve, nem pode fazer-nos esquecer que o homem é um ser vivo com vastas e complexas aptidões e funções que escapam a essa racionalidade, ainda que possamos conjeturar que são processos biológicos inteligentes, que ocorrem à revelia da nossa consciência e da nossa vontade, são uma atividade racional. Ou seja, ao descobrirmos e reconhecermos que grande parte daquilo que ocorre e acontece, designadamente no ser humano, seja por efeito voluntário, consciente, ou não, estamos a ser racionais, a usar a faculdade da razão.
A educação e o ensino podem desempenhar um importante papel na preparação da atenção e dos processos de avaliação da realidade, natural, humana e social, despistagem de equívocos, de aparências ilusórias, de crenças injustificadas, mas também podem ser fomentados para reforçar e levar a aceitar acriticamente como verdades e valores, mitos, narrativas, prescrições, normas, cânones, ou situações de facto consumado, mais ou menos inelutáveis a cuja realidade não se pode deixar de dar uma resposta adaptativa, sendo que, em si mesma, essa realidade já se apresenta como uma resposta adaptativa.