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domingo, 4 de maio de 2014

O livro de todo o conhecimento I



O dia de hoje foi normal até há pouco, quando decidi sentar-me para escrever sobre o dia de hoje. Ainda sem saber porquê, comecei logo a ter a percepção de que o dia de hoje foi, afinal, um dia extraordinário. Levantei-me de madrugada com a história do livro de todo o conhecimento na cabeça mas só escrevi o título porque as ideias não desenvolviam. Voltei para a cama e não dormi a pensar que tinha de levantar-me antes das oito, para a abertura da bolsa. Às oito já estava em frente do computador, como venho fazendo há anos. Nesta altura, a história do livro de todo o conhecimento parecia-me ainda mais difícil de escrever, como se tivesse sido um sonho. Sabem como é difícil, para não dizer impossível, passar os sonhos para o papel?! Quanto à bolsa, mais um dia à espera da abertura de Wall Street! Adiante. Banho. Aula de Economia sobre sociedade de consumo, laxismo, hedonismo e os males que podem advir para o mundo. “Quando as batalhas terminam aparecem os valentes”…
Apetecia-me tanto comer tripas à moda do Porto regadas com uma garrafa de tinto de 37,5cl…
Mas estava à minha espera o rei, desculpem, não era o rei, era a princesa, bem, vocês não conhecem, linda de entontecer, envergando diáfanos atributos, que me concederia o privilégio de a fazer feliz entre o período do almoço e o do lanche.
Cheguei atrasado. Não previra que uma fila de carros embandeirados retardasse o trânsito com euforias altifalantes porque é tempo de campanha eleitoral e “Viva a República”.
Logo constatei que um indivíduo, vestido de branco, de pé, num estrado colocado na rotunda, de megafone numa mão e uma bandeira branca na outra, tinha feito parar duas caravanas de manifestantes, uma do PS, que seguia em direcção indefinida e, outra do PSD, que andava às voltas. O indivíduo do megafone e da bandeira branca clamava distintamente, ora para a caravana dos do PS ora para a caravana dos do PSD, num tom messiânico:
«Eu não podia sentir-me mais à margem deste espectáculo. Será por isso que o considero triste? Eu não faço parte desta sociedade? Não me identifico com ela? Não me comprometo com ela? Não gosto dela? Se pudesse estava noutro sítio, com outras pessoas? Por favor, responda quem souber. Não pensem que não sou político dos sete costados ou que não tenho partido. O meu partido é não ter nenhum dos partidos existentes. Passividade não é comigo. E, quanto a ir votar, preciso de mais alternativas para me sentir livre. Ouviram? Livre. De Liberdade. O voto em branco é pouco. A abstenção, os mentores do sistema político converteram-na em nada, assim como os votos nulos.
Sou político, tenho política e a minha política é esta: deixem de manipular as pessoas pelos medos, tentem manipulá-las pelas genuínas alegrias e direitos. Não lhes acenem com direitos com o objectivo, dissimulado, de lhes cobrar obrigações e deveres. A democracia só não perdeu completamente o significado de poder exercido pelo povo, não porque os políticos, a classe política, o represente legitimamente, mas porque, apesar desta incongruência grave, o povo vai exercendo o seu poder por outras formas, pagando os custos elevados de todas, porque, na realidade o dito povo paga aos políticos para exercer o poder que não exerce e paga o contra poder para fazer face aos mesmos políticos que contra si o exercem.»
Julgo ter percebido bem estas últimas palavras, mas não garanto, porque as caravanas dos manifestantes faziam cada vez mais barulho, com claxons, apitos e altifalantes, com o objectivo aparente de abafarem o som do megafone.