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quinta-feira, 8 de dezembro de 2022

Sem regresso

Depois de atravessar a nado

As águas geladas do rio neve

Ouviu os corvos a crocitar

Enquanto sobrevoavam

Em círculos

O que ao longe

Parecia uma montanha

Mas ao perto

Era um inimaginável cúmulo

De êmbolos e cambotas

Dínamos e gambiarras

Eixos e jantes de tratores

Tanques de guerra

Pedaços da fuselagem

De aviões militares

Tudo amontoado numa pilha

De ferrugem sobre a carcaça

De um porta aviões

Que ninguém sabe como foi

Ali parar

Durante dez anos não fez mais

Senão inspecionar aquele arranha-céus

De sucata onde o vento fazia música

Que o fazia arrepiar

Mas foram precisos mais dez

Para chegar ao topo desses desperdícios

E se sentar

Avistando então ao fundo o mar

E as cidades dos humanos

Que toda a vida imaginara

Mas sentiu a vertigem terrível

De ser impossível regressar

Daquela altura

Que antevia como sepultura.