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domingo, 7 de novembro de 2021

O bem e o mal

Não existe espaço para outro paradigma que não seja o de bem e mal? Então a cultura ocidental, judaico-cristã, não deixou espaço para mais nada? E o tempo que é preciso para o comum dos mortais perceber isso? Torna-se tão longo que é quase garantido que, até ver, não haverá nada de novo. É como aqueles estudos que ninguém tem paciência ou interesse para ler, que muitos dizem ter lido, que fazem sucesso, que só cem anos depois algum excêntrico descobre que está errado e que, na realidade, é a ciência a progredir.

Ocorre-me pensar que o bem e o mal, enquanto realidades, comportamentos, condutas humanas, referidos a um padrão de moralidade, apesar de, ou por causa de, ser sobretudo prescritivo e impositivo heterónomo, a que as religiões, à falta de melhor, deram carácter totalizante, senão absoluto, constitui um verdadeiro desafio à inteligência quando tem de julgar se o mal é o que amamos, e se não tudo, e se o bem pode ser o que odiamos, e se não tudo.

O amor e o ódio têm sido tratados, pela política e pelas ciências, como algo da competência de poetas e romancistas, ou seja, como algo imaginário, que não tem catalogação na lista canónica dos instintos, ou da fisiologia, mais focada no aparelho digestivo e outras mecânicas anatómicas.

Mas é claro que, numa lista de prioridades, até pela atenção e preocupação que lhe dispensa a cultura em geral, o amor e o ódio estão à frente do resto.

Nada é mais importante para o homem que o amor e o ódio. As guerras não se travam por causa do bem e do mal. Nas democracias as campanhas não debatem o bem e o mal. Nem nos parlamentos. Ninguém mata por causa do bem e do mal. Nem dá a vida. Nas religiões o bem e o mal tem a ver com deuses e demónios, não tem a ver com pessoas. Nos tribunais, o bem está de um lado, o mal está do outro. Na economia, bem é valor com expressão pecuniária.

Pois bem, enquanto não encararmos a realidade do amor e do ódio como é necessário ou, pelo menos, conveniente, estaremos a negligenciar o maior problema da humanidade, a ignorar o que não pode ser ignorado, sob pena de sermos continuamente derrotados pelo que não controlamos. As guerras não se travam por causa do bem e do mal. Ninguém quer saber do bem e do mal, a não ser os filósofos e os teólogos e os clérigos e os religiosos.