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quarta-feira, 24 de fevereiro de 2021

Um país sabotado

Entre as preocupações e frustrações, neste país, uma das maiores é ser um país ao contrário. Não é um país para viabilizar e facilitar e ajudar o cidadão.

É um país para derrotar, diminuir e anular o trabalhador crédulo e confiante de boa fé.

É ser uma plataforma de sabotadores.

É uma engrenagem em que se entra grande e se sai pequeno. Em que se entra optimista e se sai aniquilado.

Isto aprende-se, desde muito cedo. Só há lugar para os melhores, mas, no fim, não há lugar para ninguém. É muito preocupante a nossa cultura de sabotagem e de sabotadores. É no que dá a aprendizagem, até pela experiência diária, de que toda a gente anda a sabotar o trabalho de toda a gente.

Nós não somos um país adiado, somos um país sabotado.

E quando esta cultura se instala, não está tudo perdido, mas estamos perdidos. A parte interessante e positiva é que não está tudo perdido.

Quem mais e melhor sabota, mais e melhor faz. Não é o salve-se quem puder, é o sabote quem puder.

Nem precisava de referir a escola superior da política.

Mas, o que tem sido a política senão a sabotagem mais concertada e mais imbatível dos sonhos e das aspirações e do trabalho de quem acredita na solidariedade e na justiça, enfim, no amanhã?

Ao serviço de quem têm estado os nossos partidos e os nossos governantes, sob a capa da impunidade? Que miserável visão nos proporcionam os governantes!

Muitos dirão que é tudo uma questão na perspectiva do lado de que se está.

domingo, 21 de fevereiro de 2021

Banqueiros e cumplicidade de políticos

Os banqueiros e os políticos cúmplices são a fórmula imbatível e inexpugnável para quebrar a espinha dorsal de uma sociedade crédula e confiante.  

É o pior que se pode fazer, tudo por ganância e por desprezo total dos mais elementares valores, códigos de honra e ética social, para não falar em Códigos Civis e Penais.  

A educação para a cidadania e para a literacia financeira devem deter-se pacientemente nestas realidades, muito tristes, é certo, mas incontornáveis.  

E estamos a falar muito vagamente, de um mundo que gere as poupanças dos outros, praticamente sem controlo, e que, tantas vezes, promove investimentos em que, fraudulentamente, as perdas de uns são uma das faces da moeda dos grandes ganhos de outros. 

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2021

A arte não tem outro modo de ser senão ela própria

A arte não tem outro modo de ser senão ela própria. 
A um «objecto» de arte, seja poema, pintura, escultura, música, não se pode exigir nada. 
Não se pode exigir que esteja "bem escrita", "bem pintada", etc.. 
Em tempos, numa conversa de passagem pelo corredor da escola, disse a um professor de português, a propósito não sei de quê, que um poema, um conto, um romance, por mais erros de ortografia, e outros, que tenha, não pode ser considerado mal escrito. 
Ele ficou a olhar para mim sem perceber que eu estava a falar a sério e riu-se. 
O artista não está vinculado a nada. 
O autor de uma tese está vinculado a imensas coisas, não pode escrever o que lhe der na veneta. O executante de uma partitura e o professor de português, também. 
Só o artista não. 
Nem sequer está vinculado a fazer arte. 

terça-feira, 2 de fevereiro de 2021

A sabedoria não cai do céu


A sabedoria não cai do céu.  

A crença religiosa segundo a qual, no princípio, o homem não precisava de sabedoria, mas que passou a precisar a partir do momento em que cometeu o erro/pecado de querer saber, tem muito significado. E, se corresponde a alguma realidade, não corresponde à narração, por exemplo, do Genesis, na Bíblia. A lógica de que só a partir da interrogação se pode precisar de saber responder e que, do reconhecimento do erro da resposta, se pode precisar de responder de novo, talvez melhor, ainda que não garantido, pode dar lugar a inúmeras narrativas diferentes, com ou sem deuses, mais ou menos fantasiosas, mais ou menos fascinantes e encantadoras. Não deixam, porém, de ser ficções construídas para tentar dar verosimilhança a uma ideia acerca de factos desconhecidos, por mais que se pretenda que sejam aceites como verdadeiros. 

A crença religiosa, não se limitando ao facto de o homem ter de resolver os seus problemas, atribui significações religiosas e implicações morais à sua situação e à sua condição de dependência e de risco, onerando-o com toda a responsabilidade pelos males a que está sujeito e cobrando dele todo e qualquer benefício de estar vivo, por ser inteiramente devido à contemplação e misericórdia de Deus.  

Se algo corre mal, é falta de sabedoria, culpa sua. Se algo corre bem, é como soía, e os méritos são de Deus. Para evitar os males e ter esperança, mas nunca a certeza de que algo corra menos mal, ou corra bem, deverá o homem empenhar-se de alma e coração e inteligência, com a única certeza de que as vantagens não são conquistadas, mas sim providenciadas. 

Então, a sabedoria só podia significar viver na confiança e na fé da providência em observância dos mandamentos da religião. E esta sabedoria tornava-se tanto mais concreta (e verdadeira, no sentido de experimentada), quanto mais era institucional, imperativa e sancionada. 


domingo, 31 de janeiro de 2021

Quem quer ser sábio? VI


A resposta à questão da Sabedoria não é geral e abstracta, nem consensual, nem apenas concreta e é sempre a resposta possível. A resposta possível, não sendo a ideal, é boa, contanto que, como diz o ditado, o óptimo seja inimigo do bom. 

As culturas vão corporizando e instituindo como valores aquilo que a experiência e o saber permitiram concluir que são boas soluções. Daí o dizer-se, correntemente, que as culturas são expressão de sabedoria.  

Quer do ponto de vista individual, quer do ponto de vista das organizações e das instituições sociais, são constantes a indagação e a discussão e as decisões sobre o que, num determinado momento, para um determinado problema, é a melhor resposta. Por exemplo, a melhor resposta da religião pode não ser aceite pela filosofia e vice-versa, ou pelo positivismo, ou pela ciência. E a melhor resposta para mim, pode não coincidir com a da ordem instituída.  

A Sabedoria está sempre a ser construída e reconstruída, num processo inevitável de renovação vital. Neste ponto, o que tem de ser tem muita força e não há como fugir ou impedir que se cumpra a Sabedoria. Ela é a condição humana.  

Nem a Sabedoria nos abandona, porque não existe. Nem nós a abandonamos, porque não a temos.  

Mas, então, o que é que nos faz ter noção de Sabedoria se não a temos e se ela não existe, pelo menos nos moldes do que habitualmente designamos como existente? 

E por que ousamos dizer que o conhecimento mais difícil de alcançar, mas essencial para a nossa relação com os outros, com o mundo, é o conhecimento de si mesmo? 

Que noção temos de “conhece-te a ti mesmo” e que grau de conhecimento de si mesmo alguém, reconhecidamente, revelou, que nos autorize a preconizar o conhecimento de si mesmo? De qualquer modo, isso não é mais do que um conselho, ou preceito, que nada nos diz sobre como realizar essa tarefa, alegadamente, "tão superior". 

Um dos pontos fracos de todo o sistema normativo é prescrever a conduta (por acção ou omissão) e nada dizer sobre como fazer, quais os procedimentos que permitem cumprir. 

Outro ponto fraco é dar de barato o problema de que, para além de saber como, ainda falta fazer, ou seja, é necessário que uma pessoa admita e reconheça a importância e a possibilidade de se conhecer a si mesma, tenha a noção do que é preciso fazer e a possibilidade concreta de o conseguir e, finalmente, que o faça. 

Ora, a única coisa, que lemos e ouvimos sempre, é “conhece-te a ti mesmo”. Os outros pontos que assinalei parece que ficaram suspensos há séculos, como se não tivessem tanta ou mais importância.  

O triunfo da ciência não tem sido conseguido na investigação dos problemas e na confirmação, concretização das hipóteses? 

Quando se trata, por ex., do que se deve ensinar hoje nas escolas, é frequente dizer-se que, em vez de memorização de informação, se invista no pensamento crítico, que se ensinem as crianças e os jovens a pensarem pela sua cabeça, que a aprendizagem deve prepará-los para a mudança constante e para o stress que isso causa, etc..  

Mas isto toda a gente sabe. 

O que talvez ninguém saiba, e era preciso que dissessem, é como é que as crianças, os jovens e os adultos reconhecem a importância disso, como é que, alunos e professores, poderão operacionalizar isso e, finalmente, fazer, realizar isso.  

De certa forma, se Sabedoria significa conhecer a realidade, conhecer-se a si mesmo, identificar o erro e não agir contra a realidade, nem contra si mesmo, corrigir o erro, ou seja, adaptar-se à mudança, é importante que se torne isso. 

Ainda que, aqui, tenhamos mais questões: como vamos preparar-nos para uma mudança que não sabemos qual vai ser? E a adaptação à mudança o que é que significa? Se não me adaptar à mudança, isso não significa que me adaptei ao meu modo? Ou significa que não mudo, ou que mudo num sentido que, supostamente, não me é vantajoso? E os que se adaptarem à mudança, mudam por quererem, por lhes ser supostamente vantajoso? 

 

Teremos a Sabedoria de que formos capazes, porque não há outra.  

Carcomida a bengala de Deus e levados nas asas da inteligência artificial, sabedoria será a melhor resposta aos problemas da sobrevivência. 

sábado, 30 de janeiro de 2021

Quem quer ser sábio? V


A Sabedoria não é algo que exista e se encontre em algum lugar. Não está, nem pode estar, senão no pensamento e na acção do homem, no modo como este enfrenta e vive a vida, os problemas da vida e os pensa.  O homem, ao dar-se conta, pela experiência e reflexão, de que tem margem para escolher e de que a sua acção ou inacção têm efeitos e consequências, exercita a sua aptidão para a sabedoria e o desejo de conceber e operacionalizar o melhor dos modos de enfrentar, pensar e viver a vida, não apenas para cada situação particular e concreta mas para todas as situações da vida, em geral abstracto 

Se há modos diversos de o fazer, se há uns melhores do que outros, é irrecusável pensar qual será o melhor, como saber e como realizá-lo.  

Era tão bom que as respostas estivessem disponíveis em algum lado...  

Mas não, nós é que vamos decidir se há respostas, se umas são melhores do que outras, qual é a melhor e tentar segui-la ou aplicá-la, ou, simplesmente, não fazer nada, se for possível.  

Apesar do que algumas religiões dizem, não creio que algum deus tenha dado qualquer sinal do melhor modo de encarar a vida ou do que devia/deve ser feito. Se o fará, não sei e, se alguém souber, que faça o favor de informar. 

A tentação de encontrar um deus, ou um sábio, que resolva os problemas é tão grande que o homem não foi capaz de lhe resistir.  

Mas errou redondamente. As religiões cometeram a fraude de dar as respostas como se estas fossem a antecipação daquelas que o homem, por si só, segundo alegados ou supostos critérios de sabedoria, deveria encontrar e que, talvez, nunca alcançasse.  


sexta-feira, 29 de janeiro de 2021

Quem quer ser sábio? IV

Este ideal de sábio é tão irrealista, inalcançável, fantasioso, desenraizado da própria humanidade, que se torna contraditório ou absurdo por requerer e supor a própria humanidade do sábio, justamente o que dá razão de ser ao ideal de sábio. Este, sob pena de se contradizer e negar-se a si mesmo, não pode deixar de ser um ideal humano, que os homens queiram, possam e reconheçam valor em realizar. 

As posições filosóficas idealistas, tal como as posições religiosas, quando se colocam num plano “não realista”, fora da realidade como ela éabstractas e puramente racionalistas, perdem credibilidade como concepções filosóficas, porque se posicionam fora e contra a realidade, o que é um erro.  

Ora, sendo a Sabedoria o objecto e o objectivo da filosofia, é da essência desta identificar e posicionar-se contra o erro.