terça-feira, 14 de janeiro de 2025
Entoar
sábado, 11 de janeiro de 2025
Rumos, remos e arte de rumar
Quantos de nós já fizeram esse
E o percurso inverso
Quantos de nós já remaram
Na ida
E estão a remar de regresso
Mas todos os caminhos vão dar ao fim
Nenhum ao começo
Carlos Ricardo Soares
domingo, 29 de dezembro de 2024
Aproximações à verdade XXXVI
Hilário: compreendo a dificuldade que sentes em ouvir-me quando falo de recordações minhas que são narrativas do que não viveste
Amiga: sobretudo quando me falas de sítios onde nunca estive e de sentimentos que eu não sei se tive alguma vez
Hilário: são imensas as coisas que nunca poderemos comunicar com ninguém, nem através da música, nem através dos gestos, nem através das palavras
Amiga: até a saudade, nesse aspeto, é um fardo pesado
Hilário: é como se não tivéssemos sido capazes de dominar o tempo como soubemos preservar as memórias
Amiga: não fomos capazes de parar nesses cenários, saímos deles por alguma razão que, agora, nem nos interessa saber qual era
Hilário: mas era a vida a fluir, não éramos só nós a deslocarmo-nos de uns cenários para os outros, era toda a gente
Amiga: nem quando estamos sozinhos, muito tempo no mesmo lugar, pensamos na mesma cena mais do que uns instantes
Hilário: termos esta noção é como se víssemos o tempo a passar diante dos nossos olhos
Amiga: sem o podermos parar
Hilário: mesmo que o quiséssemos parar
Hilário: e não lhe disseste
Amiga: disse, mas quando disse já não estava no tempo desse encanto, já estávamos no tempo de olhar para o que passou e, uma hora mais tarde, já estava a viajar em sentido contrário, de regresso a casa, que também seria a minha casa por pouco mais tempo, e assim sucessivamente
Hilário: quando olho para o passado só vejo desastres, demolições, tempestades, guerras, mortes, aflições, trabalhos, um mundo a ruir à nossa volta
Amiga: mas tivemos a sorte de tudo isso ter acontecido à nossa volta e não nos ter acontecido a nós
Hilário: aconteceu-nos, também nos aconteceu e o que aconteceu ainda continua a afetar-nos de múltiplas formas
Amiga: do mesmo modo que não paramos nos melhores momentos, com pena nossa, também não paramos nos piores, para nosso alívio.
Carlos Ricardo Soares
domingo, 22 de dezembro de 2024
Este Natal
domingo, 15 de dezembro de 2024
Lei das escolhas II
Devemos ter em consideração esta concepção de racionalidade como função natural que opera tanto nas crenças religiosas como noutras quaisquer.
Por outras palavras, não direi que algo, seja o que for, torna a escolha racional, digo é que a escolha é racional, independentemente daquilo sobre que incide.
Por exemplo, quando se objeta «há muita coisa que não vem de um processo consciente» que «são muito influentes em crenças e elementos culturais» não se está a reconhecer que a minha teoria não põe em causa que a maior parte daquilo que somos e fazemos, desde nascer, respirar, dormir, crescer, pensar, etc., precede a consciência e até pode prescindir dela, exceto talvez pensar.
quinta-feira, 12 de dezembro de 2024
Óbvio, "uma ova"!
Sabemos, até por experiência de vida elementar direta, que existe um hiato, ou distância intransponível,
entre a representação mental que fazemos das coisas e as próprias coisas (admitindo que representação mental e as coisas representadas são realidades e realidades distintas, uma vez
que, ao dizermos isto, continuamos a fazer representações mentais de coisas que são representações mentais).
Aliás, os ilusionistas profissionais fazem mesmo questão de
começar por alertar o público, avisando que “quanto mais se olha menos se vê”, ou “quanto mais olharem, menos veem” e as pessoas parecem confirmar. Como é possível?
E estamos a falar de situações de mera observação directa, sem intermediação de linguagens.
Quando passamos para situações em que a representação que
nós fazemos é feita a partir da observação, percepção, descodificação, de uma linguagem, tudo se pode complicar indefinidamente e um exemplo disso são os discursos
filosóficos.
No entanto, na matemática e na geometria podemos encontrar talvez os exemplos mais claros de que o óbvio, mais ou menos óbvio, é mesmo um problema de linguagem. Por exemplo,
2+2=4 é mais óbvio do que 2%+2, ou que uma unidade dividida por 2 dá 2 unidades, que a unidade é a grandeza mais simples; ver que o triângulo e o quadrado são polígonos é
mais óbvio do que ver que cada lado é um segmento de recta e menos óbvio será ver que um polígono tem pelo menos três lados e, ainda menos óbvio, que o triângulo é,
nesse aspecto, o polígono mais simples.
Na realidade, ainda a propósito do óbvio, pode-se viver cem anos a estudar matemática e nunca ter pensado em coisas tão óbvias (admitindo
que é óbvio o que acabo de escrever e aqueles exemplos).
Carlos Ricardo Soares
segunda-feira, 9 de dezembro de 2024
Aproximações à verdade XXXV
Amiga: estavas a dizer que o sonho comanda a vida?
Hilário: conheces a Pedra filosofal?
Amiga: sim, do António Gedeão, eles não sabem que o sonho…
Hilário: esse poema tornou-se famoso pela música e voz de Manuel Freire
Amiga: mas olha que não é apenas o sonho que comanda a vida
Hilário: pois não, até há muitas vidas que não são comandadas pelo sonho
Amiga: mesmo aquelas que o foram alguma vez e deixaram de o ser
Hilário: deixamo-nos embalar por uma canção e…adormecemos
Amiga: sonhamos
Hilário: ou temos pesadelos
Amiga: mas não são os pesadelos que comandam a vida
Hilário: não diria isso com tanta convicção
Amiga: ninguém se deixa guiar por um pesadelo
Hilário: mas há quem diga que somos guiados pelo erro e pela estupidez
Amiga: isso só acontece enquanto não percebemos que estamos errados
Hilário: e o que acontece quando a estupidez não deixa reconhecer os erros?
Amiga: não me agrada essa ideia de a estupidez comandar a vida
Hilário: há muitas outras coisas que não nos agradam
Carlos Ricardo Soaresquarta-feira, 4 de dezembro de 2024
Encruzilhada e transições
Quando estar na encruzilhada, ou na transição (digital, climática, energética, demográfica, social, política…) é estar consciente dos processos de mudança em curso que dificultam e complicam a necessidade de manter e de reproduzir uma ordem social, económica, política, jurídica, nacional e internacional, pelo menos ajuda a compreender porque é que as instituições deixam de ter a capacidade e a agilidade necessárias para amortecerem e se adaptarem aos choques em cadeia dessas transições, por mais expectáveis e previsíveis que sejam.
De qualquer modo, será através das instituições, atualizadas, renovadas, reapetrechadas, que as transições ocorrerão, num processo dinâmico e dialético de várias vertentes, sendo uma delas por inerência das instituições, porque, pela própria razão de ser, devem assegurar e reproduzir as condições para a realização de objetivos programados, e outra por iniciativa própria, antecipando e promovendo processos de mudança.
O tema abre perspetivas de análise e de compreensão dos fenómenos sócio-culturais, mormente políticos, carregados de interesse.
Os Estados, através das suas instituições, mais nos últimos séculos, têm vindo a assumir um protagonismo e uma iniciativa crescentes nos processos de mudança, todavia fazem-no, não apenas pelas vantagens que essa mudança pode trazer por si mesma, mas também e sobretudo porque os processos de mudanças se representam como necessários, ou como a melhor forma de manter e reproduzir uma certa ordem das coisas.
Isto parece paradoxal, mas está na linha daquele pensamento anedótico segundo o qual é preciso trabalhar muito para que tudo continue na mesma e não se consegue.
Ainda nesta ordem de ideias, e para abreviar, se quisermos pensar, por exemplo, no modelo do Estado liberal, veremos que este, para o ser, mesmo que se limitasse a manter e a reproduzir o modelo, só para conseguir isso já teria de fazer muito mais do que isso, tomando e assumindo prerrogativas e iniciativas de toda a ordem que, em última análise, não são próprias de um Estado liberal.
Carlos Ricardo Soares