Num mundo de ideais por realizar, em que idealizar
deixou de ser prudente e sensato, em que o ideal é não ter ideais, ser poeta é
a pena máxima a que alguém pode ser condenado por descobrir que um homem é uma
ilha e sentir que isso é o contrário de praticamente tudo, excepto de um ideal.
Num mundo em que a indústria do som, das arengas, das
propagandas e dos engodos é capaz de manter perpetuamente infatigável a máquina,
a troco da nossa fadiga e alheamento, ser poeta é ser um pobre diabo sem
procuração para representar nada nem ninguém.
Neste mundo estranho, fascinante para quem consegue, num
concurso para escolher o seu sósia, o poeta não seria classificado nos três
primeiros lugares.
De todos os que falam, ou lhe falam, em nome de
qualquer coisa, ou entidade (é a mesma coisa), seja Deus (não há quem declaradamente
se afirme mandatário do diabo), seja a Verdade, seja a Justiça, a Sabedoria, a
Beleza, a Virtude, o poeta não se contenta com menos do que uma procuração conferindo-lhes
esses poderes especiais, devidamente assinada por quem lhas, alegadamente,
outorgou. E por não se contentar com menos do que isso, fica por contentar,
porque ninguém tem esses poderes.
O poeta não fala por procuração. Não é advogado de
causa nenhuma, nem professor de coisa nenhuma. Ao falar, em nome próprio, o
poeta não está a falar acerca de nada, está a falar (a)penas.
Sem comentários:
Enviar um comentário