terça-feira, 5 de outubro de 2021
Linguagens e música
com
milhões de anos
que
esventra moléculas com a mesma apetência
com
que chega às estrelas na ponta de um tubo
e
saem de realejos avariados
em
músicas que ninguém aprende a tocar
senão
mais tarde
quando
alguém reparar
que
nada tem conserto
e
der um concerto
que
nós ouvimos de modo incipiente
sonâmbulos
delas
nas
mãos delas
possuídos
por elas
ébrios
delas
loucos
que pensam que as têm na mão
e
que as fazem aliadas
mas
não.
sábado, 25 de setembro de 2021
Eu e Euclides
Eu e Euclides não vivemos no mesmo mundo
Podemos
estar no mesmo planeta
Na
mesma sala
À
mesma mesa
Euclides
vive num mundo
Que
foi criado com subtileza
E
livro de instruções
E
acha que o único trabalho digno
É
aprender a seguir as instruções
Por
isso quando morrer vai para o céu
Ou
para o inferno ou para o purgatório
E
diz que eu não tenho escolha
Por
ter nascido no mundo impossível
Que
não foi criado
E
quando se nasce num mundo impossível
Não
se vive nem se morre
Eu
já
lhe disse que não sei nada do mundo dele
E
fico espantado como ele sabe tanto do meu
Apesar
de ser um mundo impossível
Euclides
diz que vive no melhor dos mundos
Eu
Compreendo
melhor o problema
De
vivermos em mundos diferentes
Eu
Crio
espaço
Euclides
cria o número
Eu
Crio
ambiente
Euclides
não quer saber
Fala
convictamente
E
chega a embaraçar
Ostentando
a chave
De
porta inexistente
O
meu mundo é construir liberdade
O
dele estala agoiro
A
partir de linhas imaginárias
Sobe
aos pináculos
Da
comoção
Mas
onde estou
Só
alcanço saber quem ousou
Ser
mais do que devia ser
E
o pôde fazer
Euclides
cedo aprendeu a fazer
O
que quer
Mas
ninguém ainda lhe ensinou
A
cumprir o seu dever
E
se me olha para dizer que
Eu
Faça
o que fizer
Não
faz sentido
Euclides
não é amigo.
sexta-feira, 17 de setembro de 2021
Liberdade de expressão - Igualdade - Liberdade
O facebook pode ser um instrumento de influência e
de condicionamento de opinião e, só por isso, já requer vigilância por parte de
todos nós.
A liberdade de expressão é da máxima importância e
poucos se dispõem a bater-se por ela, como se ela fosse negligenciável, em
troca de um sorriso, de uma palmadinha nas costas ou de uma esferográfica com o
logótipo do chefe.
Quando se negligencia a liberdade de expressão, ou
melhor, quando um de nós, seja em que situação for, perante o papa ou o rei, se
sente impedido, constrangido, abafado, com receio de ser banido do círculo e
lançado às feras, está na hora de pensar que a liberdade de expressão é só para
alguns.
Mas o verdadeiro problema da falta de liberdade de
expressão, que é uma dura realidade, mesmo nas democracias mais evoluídas, é
que ela é o sintoma mais chocante da falta de liberdade e da negação da
igualdade.
segunda-feira, 13 de setembro de 2021
Ainda não chegamos
Naquela manhã o nosso objectivo era simples
montar nos cavalos
e numa hora
chegar ao ponto donde se avistava o castelo
depois cada um procuraria o melhor caminho
mas nunca atravessando o rio
Estávamos habituados a cavalgar a planície
e pernoitamos sob a via láctea
hipnotizados pelo concerto arrebatador
da fauna noctívaga
e pelo aroma inesquecível da pradaria
até os cavalos sonharam
que tinham asas
Para evitar o sol escaldante
ainda as estrelas brilhavam
arreamos as dóceis montadas
e sonolentos partimos
mas ainda não chegamos.
quinta-feira, 9 de setembro de 2021
Perder de vista
sábado, 4 de setembro de 2021
Deambulação
Deambulas
De suave fragor
De vagas
De mar
De verão
De olhos
De peixes fora de
água
De aves agora famintas
De teu pão.
quinta-feira, 26 de agosto de 2021
O MAIOR INIMIGO
Quando o velho bebeu o último copo
E foi embora
Fecharam o bar
Lá fora no escuro da noite
Ele sabia que os lobos só o espiavam
Por curiosidade
Para lhe farejarem a alma
E não lhe quisessem o coração
Mas por precaução
Levava consigo duas cabeças de carneiro
Para lhes arremessar
Quando se aproximassem
Não era a primeira vez
Que tinha de percorrer um caminho
Emboscado
Até chegar a casa onde vivia sozinho
E desencantado
Era como se os lobos em troca
O escoltassem
Porque matariam qualquer ladrão
Que arriscasse ser farejado
Nos seus intentos
Toda a vida preferiu percursos perigosos
E essa é a explicação que dá a si mesmo
Para a solidão em que sempre viveu
Em troca de não ser forçado a nenhuma alienação
Que não fosse o normal esquecimento
Faltava-lhe instinto de fuga
Vivia como se não passasse pelas coisas
Como se permanecesse num tempo de burro
A olhar para a experiência
Sem descartar nada
Nem o perigo
Até que já não podia mais
Enfrentar o maior inimigo
A tristeza
Das suas memórias.