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sábado, 18 de julho de 2020

O protagonismo dos livros

Os livros também são protagonistas de aventuras e de histórias, por alguma razão, empolgantes e inesquecíveis. 
Como o livro, se houver, serão poucas as realizações humanas que mobilizaram e mobilizam tanto o labor, a criatividade, o génio, a inteligência e a paixão do homem. 
Se não acolhe tudo o que importa exprimir e comunicar, porque nem tudo é susceptível de ser plasmado ou veiculado em livro, poder-se-á dizer que nada do que aspira a ser dito e merece deixaria de ser feito em livro, se pudesse.

sexta-feira, 26 de junho de 2020

Letra morta

Há imensas coisas que não passam de letra 
e outras tantas que são letra 
morta.
Até há imensos projetos de arquitectura 

que só o arquitecto vê.
São coisas, correspondem a ideias, 

mas enquanto não saem do papel...

terça-feira, 16 de junho de 2020

Quando olho é como se já não visse


Quando olho é como se já não visse
por ser tão longe e tão profundo
o significado em que tudo o que vejo
se tornou
nesta surpresa que sempre procurei
quando acreditava que o futuro
era o tempo de realizar sonhos
que o presente então
ao meu esforço negou
 eu olhava e era como se não visse
por não ser preciso
mesmo assim eu queria ver
o significado em que tudo se tornaria
o presente me dá quase sem eu querer
quando olho como se já não visse
o que desejava ver.

segunda-feira, 1 de junho de 2020

Continuidade/descontinuidade

Gostava de referir algumas questões atinentes à continuidade/descontinuidade entre empirismo/racionalismo, considerando que, no tocante ao inato, às ideias inatas, percepções inatas, emoções, as neuro-ciências têm apresentado estudos muito curiosos em recém-nascidos.
Por outro lado, parece-me que o empirismo é, pelo menos, tão racional quanto o racionalismo é empírico. A própria experiência racional é uma experiência. Experiência, neste sentido, é também a experiência estética, poética, religiosa.
Estamos imersos na experiência, mesmo quando flutuamos até à superfície e colocamos a cabeça de fora (se é que isso acontece, ou pode acontecer). A música e o prazer e a dor são experiências.
Parece-me um trocadilho afirmar, como já tenho lido em enciclopédias, que "só a experiência permitirá decidir da verdade ou falsidade de um enunciado".
Não é a experiência, mas a razão, que permitirá decidir da verdade ou falsidade de um enunciado. Mas o que é a razão sem a experiência?
Outra questão é a da objectividade/subjectividade. A comunicação processa-se no plano da objectividade. O subjectivo deixa de o ser quando se comunica. A linguagem é um domínio objectivo.
O relativismo é outro problema inerente ao conhecimento, mormente enquanto correlação empírica, e não necessidade lógica.
Agora, brincando um pouco, em inúmeras situações em que estamos cheios de razão, nem por isso temos mais do que aqueles que, não tendo razão, têm o que não temos. Quando só temos razão, ainda podemos ser acusados de não termos nada.

sexta-feira, 29 de maio de 2020

Os democratas que não construíram a democracia

Ainda nos falta um bocado de trabalho científico e filosófico, descontraído e desinteressado, isento e tranquilo, para começarmos a compreender o problema da linguagem, como parte das respostas e das perguntas sobre a realidade incluindo a dela própria.
Mas estão a fazer-se progressos notáveis. 
A linguagem, segundo uma abordagem interessante que li, parece que funciona num esquema digital, descontínuo, e a realidade, a vida, as emoções, funcionam analogicamente, sem descontinuidade. 
Esta hipótese, para mim, foi uma grande descoberta (andamos sempre a descobrir o que já foi descoberto?). 
O alcance desta conjectura, de que a linguagem comunica, ou pretende comunicar, a realidade mas que o faz representando-a digitalmente, envolve um conjunto de problemas interessantíssimos e que podem ser perigosos. 
Deixa o caminho aberto a todas as formas de comunicação e de mal-entendidos e de equívocos, voluntários ou não, sobre a realidade, que sempre será diferente da nossa representação dela e, inerentemente, da comunicação que dela se faz. 
A literatura, a poesia, o teatro e as artes...não obstante serem de algum modo jogos que "pervertem" e "subvertem" e "transgridem" a linguagem digital para tentarem ser analógicas, como a realidade, não deixam de ser linguagens... 
Não estou muito certo de estar a ser suficientemente rigoroso na linguagem e não tenho mais do que a suspeita de que estou a pensar numa questão algo revolucionária, em termos de teoria do conhecimento.
Quanto à democracia, enquanto ideia, nunca será destruída por ninguém. Se existe um problema porque a democracia nunca existiu para além da ideia e quanto mais se deseja, mais parece estar longe da sua concretização, é preciso identificá-lo e resolvê-lo, mas não me parece que seja com jogos de palavras como "os democratas que destruíram a democracia". 
 Apostaria na expressão “os democratas que não construíram a democracia”.

sábado, 16 de maio de 2020

Máscaras

As máscaras, os papéis, os palcos, os bastidores, temas fascinantes, para a psicologia e a sociologia e tudo o mais que envolve conduta humana, por acção ou omissão, mas particularmente importantes para o conhecimento de si mesmo e dos outros, daquilo que é o poder da imaginação, a aptidão do cérebro para trabalhar, ainda que à revelia do seu "dono, mas pouco", de produzir imagens, ideias, representações, palavras, falas, músicas, medos, ficções, movimentos... correlações, explicações, teorias...cenários... e cujo interesse artístico, estético, filosófico, social, clínico, político, comercial... tem uma dimensão astronómica.
Saberemos algo que não seja imaginado, que não seja representado? O que não somos capazes de imaginar ou de representar, estará acessível ao conhecimento? O nosso acesso à realidade é intermediado por máscaras, umas vezes de ferro, ou de plástico...e outras vezes de gestos, de palavras, de subentendidos, de equívocos...
A maior parte de cada um de nós, boa ou má, é máscara da humanidade que viveu e morreu.
E não há como tirar a máscara, porque debaixo de uma está outra.
Há é como colocar a máscara para salvar os outros.

quinta-feira, 7 de maio de 2020

O maior inimigo das artes

A arte, qualquer que seja, é incompatível com a pressa. 
Até a arte de relojoeiro. 
Encontrar o ritmo certo, o enleio perfeito do tempo, do corpo e da alma (sem concessões religiosas), talvez por ser um horizonte, nos apresse a chegar, mas esta resposta é contraproducente. 
Os nossos tempos elegeram o maior inimigo das artes, a velocidade, como vector determinante, de tal modo que o que quer que seja que não seja veloz, passa ao lado, passe a expressão, não merece que se "perca" tempo. 
É assim, mormente, desde que o tempo passou a significar, ou a ser considerado, e não apenas a valer, materialmente, dinheiro "Time is money".
E a velocidade, a adrenalina, a vertigem, viciaram o nosso sistema nervoso e deparamos com muitas pessoas a desabafar que não conseguem imaginar a vida sem elas, do mesmo jeito que ouvimos fumadores inveterados ou alcoólicos a queixarem-se da sua escravidão.
Até o pensamento, se não for rápido, que fosse. 
Quem espera por um pensamento ou uma ideia?
Se observarmos, daremos conta de que um número significativo de pessoas estão contaminadas por uma pressa na forma de falar e de fazer as coisas, que também pode ser observada na forma como andam, ou estão sentadas, sem disso terem consciência, como se estivessem sempre atrasadas para algum evento obrigatório e não pudessem perder o transporte que acabou de passar, como se o presente e o lugar onde estão fossem uma espécie de transitório e não de objetivo e destino. 
No fundo, receiam pensar, e mais ainda admitir, que não têm objectivos, nem destino (no sentido de lugar aonde desejam chegar).
Tantas pessoas em fuga. Sem saber para onde. A fuga é uma realidade. É um drama. E a fuga adopta imensas estratégias e variantes. Não é apenas um problema de ansiedade e de sobrevivência. É um modo de estar e de comunicar, de pensar e de sentir e, se não é um modo de viajar, quantas vezes viajar não é um modo de fuga?!
Mais do que um hábito, para muitos converteu-se numa disciplina, numa cultura de empresa e está institucionalizada no capitalismo, como se a nossa função natural fosse reciclar, como as minhocas, e o nosso papel social não passasse de uma sublimação que impede concluir facilmente que essa é uma realidade, que alguns acharão triste e outros, nem sequer pensam se é uma fatalidade, ou se o sentido da vida é esse, render-se-lhe.
Tudo tem de estar preparado e embalado. Pré-fabricado.
Com o "tempo dinheiro", também o espaço sofreu uma incrível contracção e tem o seu preço e é cada vez mais exclusivo e excludente. Até os espaços públicos, não são espaços onde se possa morar, como se fossem nossos, meu, teu...
De resto, tudo se agravou mais para as artes e as contemplações. 
É muito difícil, para não dizer impossível, ser deus, mais humano e independente e livre do que um Deus, parar no centro dos furacões, não aceitar ordens de ninguém e, soberbamente, não dar ordens a ninguém. 
Não trabalhar para quem não precisa.
As plantas, essas, que parece que não crescem e não podem voar, senão quando um vendaval as arranca e as transporta para algum chão em que voltem a criar raízes, que pensarão dos pássaros e do sol e da lua?...
Quem disse que uma vida não se mede em dias, meses ou anos, mas em quantidade de moeda equivalente ao tempo "gasto" para a sustentar, que é considerado "perdido" se não der retorno?
É assim, tanto com a vida dos bichos como com a vida das pessoas?
Criar riqueza hoje tem um significado muito retorcido. Um incendiário pode ser um criador de riqueza. E um consumidor de combustíveis também, assim como um vírus mortífero.
Mas, e o amor? De que riqueza é o amor?

               Carlos Ricardo Soares

quarta-feira, 29 de abril de 2020

A poesia das ciências

As emoções que a ciência é susceptível de despertar ou provocar ou mudar...podem ser tão intensas e complexas que nenhuma linguagem ou expressão conseguem traduzir, mas isso dever-se-á talvez à natureza das emoções humanas. 
Acontece, não obstante, que a própria linguagem da ciência tem a aptidão para desencadear emoções de espanto e de deslumbramento tão ou mais complexas do que as emoções ditas estéticas e poéticas e que, como elas, nos colocam perante territórios ou mapas de pensares e de sentires e de sonhares que nos arrebatam de pontos de referência e nos compelem a procurar compreensão e inteligência em horizontes inesperados e surpreendentes.