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sexta-feira, 1 de novembro de 2024

O Homem é um animal que censura


Os actos e os efeitos de censura, ou de censurar, na acepção mais ampla da palavra, estão de tal modo intricados e são tão conaturais, ou intrínsecos, ao modo de ser “sapiens”, do “homo sapiens” ou, se quisermos, à cultura como produto, resultado, efeito, consequência, exteriorização, objetivação, objetificação, manifestação da racionalidade humana, que a hipótese de perspetivarmos e analisarmos o humano, em toda a sua dimensão cultural, social e pessoal, pelo prisma da censura, se apresenta espantosamente fecunda e promissora.
Diria que o Homem é um animal que censura.
O que eu afirmo é que vivemos, a humanidade vive, sob a égide do dever-ser, como já tenho repetido a propósito da minha teoria unificadora acerca da faculdade da racionalidade, neste caso, humana, como condição “sine qua non” das escolhas, que o ser humano tem de fazer em cada momento do seu estado de consciência, como se esta, realmente, seja o “modus operandi” do acto de escolher, que o é, mesmo quando é aleatório, ou omissivo.
Em todos os casos, ainda assim, a escolha é um acto e isto significa que mesmo quando é arbitrário, o é por escolha. Esta resulta de um processo de avaliação por antecipação do efeito da escolha.
A representação antecipada daquilo que se escolhe é inerente ao processo de escolha, tanto nos casos de escolha teórica, filosófica, científica, de verdadeiro ou falso, como nos casos de escolha prática, estética, económica, ética, moral, jurídica em que, normalmente, a bondade da escolha não depende fundamentalmente de um silogismo, como nos casos do verdadeiro falso, mas de uma ponderação “a posteriori” dos custos de oportunidade, entendidos “lato sensu”.
Não vou aqui referir implicações filosóficas, científicas, sociais, políticas desta constatação, porque se trata de uma constatação, pelo menos plausível, da realidade e não de uma ideologia, política, doutrina, proclamação, acerca da realidade, nomeadamente implicações resultantes do confronto com teorias kantianas sobre a razão e sobre imperativos morais, mas quero assinalar que o imperativo para o homem, da inelutabilidade natural da escolha, o coloca, por força da racionalidade/consciência, ou consciência/racionalidade, perante todo o tipo de problemas cuja solução é a que deve-ser, não apenas segundo a ética, ou a moral, ou a estética, ou a economia, ou a ecologia, nos casos das escolhas/crenças/investimento/apostas, mas também a que deve-ser nos casos das escolhas/confirmações/provas/revisões dos enunciados de verdadeiro/falso, dos discursos filosófico-científicos. Uns e outros, como produtos culturais que são, não podem deixar de ser como devem ser.
E isto que eu afirmo com toda a simplicidade é uma pequena diferença na análise e na descrição do acto como processo de consciência (obviamente individual), que faz toda a diferença no entendimento acerca dos comportamentos humanos, nomeadamente acerca de uma evolução cultural para melhor, de tal modo que, mesmo quando se recuperam valores perdidos, isso não é um retrocesso.

Carlos Ricardo Soares

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