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sábado, 11 de maio de 2019

Matar saudades

Ser poema
carregar com o enigma 
da saudade ser 
casada com a tristeza
com tristeza 
da vida ser 
casada com a morte
de saudades
morrer
numa relação que
se tem alegria
é pouca e é
da louca
inexorável de impossíveis 
de entender 
matar saudades mas
as saudades morrem e 
com toda a impunidade
se pode matá-las
já morreram
muitas saudades
sem querer.


segunda-feira, 6 de maio de 2019

A direita não governa por interpostas esquerdas?


Há um continente, que não é velho, os continentes não são velhos, nem as pedras, nem a água, nem o céu, que os velhos, às vezes, preferem designar com outros nomes que acreditam serem mais expressivos, ou mais verdadeiros, vá-se lá saber o que pretendem dizer com as palavras, e há jovens que têm sérios problemas de ética, deles e dos outros, porque os outros não foram capazes de construir com ética, preferindo mercantilizar, assim, sem mais, como se o mercado, por si, fosse ético e há dois séculos e tal de industrialização e de capitalismo, cada qual a ver quem puxa mais pela outra, no empoderamento do dinheiro que, num ápice, arrasa florestas e envenena oceanos e cresce logo de seguida, exponencialmente, com truques e magias de reflorestação e de revitalização, agora em nome de biodiversidade e de ambiente saudável...
Há jovens que vão ter de combater a mentira de um modo mais verdadeiro que o antigo, não velho, modo de combater uma mentira com outra.
Há jovens que vão fazer a revolução necessária, quando a direita e extrema-direita, que já governam "às esquerdas" há muito tempo, deixarem de governar por interpostas "esquerdas" e passarem a dar "mais" a cara.

sábado, 27 de abril de 2019

A literatura é (não é) um facto como outro qualquer

A literatura é um facto que pode e deve ser estudado e explorado, para os fins que aprouverem a quem aprouver. Mas não é um facto como outro qualquer. É um acto. Mas não é um acto como outro qualquer. É um acto de verbalização, mais ou menos livre, mais ou menos constrangido, mais ou menos consciente, convencional e retórico, mais ou menos ritualizado e formal, que veicula qualquer tipo de pensamento, queixa, reclamação, sentimento, sensação, emoção, paixão, apelo, condenação, louvor, voto, advertência, revolta, promessa, engano, miséria, perdição...Ficcionadas ou não...

quarta-feira, 27 de março de 2019

História

Em rigor (se formos a ver bem), alguém que conhecesse a História conheceria tudo, porque tudo, na História, acontece, no espaço e no tempo.
Quem soubesse a história da química ou da literatura, ou da religião...seria um cientista tão exímio que nem existe, porque só em teoria é concebível.
A História é tudo, não esqueçamos.
E, sem História, não sabemos grande coisa, para não arriscar dizer coisa nenhuma.
Mas esta esmagadora grandeza da História é empolgante e vivificadora, porque permite os voos mais ousados, incríveis e triunfantes do pensamento e do sentimento que o pensamento provoca. As datas são, quase, a essência da História e o "mecanismo" que, quando menos esperamos, faz luz sobre um documento, uma inscrição, permitindo-nos conferir-lhe conexões imprevistas e reveladoras, como se estivéssemos num jogo de xadrez que se transfigura, ou, inopinadamente, uma chave abrisse a porta que nunca esperaríamos, pelo simples efeito do pensamento e da imaginação.
Diria que a História está para o pensamento e para a imaginação como o futuro está para a ignorância.

sexta-feira, 22 de março de 2019

Liberdade e conceito de liberdade

É praticamente inevitável cair em contradições, quando se intenta acoplar realidades e conceitos que se cruzam mas não se misturam. Com efeito, as ideologias e as crenças não podem ser culpadas de serem boas e más ao mesmo tempo.
Se, por um lado, o liberalismo económico e, por outro, o liberalismo político, funcionaram em determinadas condições históricas e deixaram de funcionar noutras, deve-se lamentar a imprevidência humana em não ter corrigido as agulhas, em não ter percebido que o esquema era o mesmo mas os problemas eram outros.
Os modelos político-económicos que levam à prosperidade, paradoxalmente, costumam ser os mesmos que precipitam nas crises, levando os mais ingénuos a perguntar por que razão se abandona um modelo que proporcionou tanto progresso.
As condições alteram-se e isso altera tudo.
Se o planeta Terra não sofresse as agressões e desequilíbrios que está a sofrer tão violentamente pela ação do homem focada numa exploração económica desenfreada e devastadora, o liberalismo continuaria a ser muito bom e todos poderíamos acalentar o sonho americano (em vez do pesadelo).
O pragmatismo de um analfabeto de há cem anos já lhe permitia vaticinar e até antever os limites das realidades e perceber as aberrações a que pode conduzir a liberdade, seja política, seja económica.
A liberdade enquanto condição não se reconhece muito no conceito de liberdade, nem este naquela, porque justamente, ela é algo físico, corpóreo, com consequências adjacentes, com externalidades negativas, é ativa, é um agente, é um sujeito que não quer ser objeto. Por exemplo: o que é a liberdade para uma pessoa destituída de poder? E o que é a liberdade para uma pessoa com poder? É igualmente liberdade?

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2019

Crenças, narrativas, valores e poder

A militância dos ateus é tão ostensiva e hostil como anti pedagógica e tem pouco ou nada de científico.
De resto, enquanto os religiosos e os crentes têm narrativas e tábuas de valores, preceitos e doutrinas que enformam as sociedades e as instituições sociais, desde sempre, com um acervo de cultura reconhecidamente edificante da pessoa e do mundo, os ateus só têm para oferecer "a contestação", baseada na falta de fundamentos fácticos das crenças. 
Ora, é sabido que os crentes não têm nem defendem uma ciência de Deus. 
E se as religiões começaram por ser pseudociências de Deus, atualmente nem precisam de Deus para serem religiões, bastando-lhes serem ideologias cujo sistema de valores e doutrinas rivalizam diretamente com qualquer estrutura político-partidária. 
Hoje, as religiões já não são o que eram. A própria pressão científica obrigou à distinção entre crença em Deus e conhecimento de Deus. 
Crença todos podem ter, mas conhecimento nem por isso. 
O problema é quando o crente toma a sua crença como padrão de racionalidade para tudo o mais. Identicamente, o problema do ateu é adotar uma posição irredutível, sem saída para lado nenhum, puramente negacionista, quando a racionalidade aspira a muito mais e exige, largamente, muito mais.
Não me considero ateu nessa acepção. 
Acredito num Deus desconhecido, por mais contraditório e paradoxal que isto possa ser. 
Deus é um mistério paradoxal.
Os ateus não têm como evitá-lo e são eles próprios "um efeito, ou corolário" desse mistério.
Mas acreditam em coisas estranhas e inexplicáveis como o Big bang. Aquilo que explodiu. 
Que é que explodiu? Porquê? E os estados sucessivos da matéria? O que é a matéria?

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2019

O que é melhor para o planeta não é melhor para nós?


Continuamos a ouvir discursos numa "argumentação clássica" acerca das desigualdades e da concentração de riqueza, quiçá a favor de uma redistribuição como solução (curiosamente, como solução para manter em movimento acelerado a roda do capitalismo na mira do mítico e sacralizado crescimento económico) dos problemas que ameaçam os capitalistas (e o capitalismo), constatando que as revoluções só acontecem quando a crise chega aos ricos, que já deixaram de o ser ou estão em vias disso.
Mas este tipo de argumentação não traz nada de novo e segue a lógica imperiosa do modelo económico paradigmático.
A estranheza deste tipo de discurso, para não dizer originalidade, é a recorrência dos plutocratas à desculpabilização de si mesmos e à culpabilização do Estado e dos governantes.
É incrível que “tenham” de ser eles próprios a vir dizer, com ênfase, que querem pagar mais impostos, que ganham demasiado dinheiro, mas que o Estado e os governantes nada fazem quanto a isso, ou porque não querem, ou porque andam “distraídos”. 
Duvido que alguma vez na história tivesse ocorrido algo semelhante, que se vai repetindo um pouco por aqui e por ali.
O Estado, os partidos, os governos, parecem reféns da lógica da sua própria dogmática ideológica. 
No futebol também há situações em que o jogador diz que não tem culpa de ganhar tanto, que nem pediu dinheiro, este é que lhe é oferecido.
De qualquer modo, estamos a assistir a uma realidade que está a passar ao lado dos discursos e das reivindicações dos nossos tempos.
Talvez possa soar a heresia dentro do paradigma clássico, mas é um facto que, sem ninguém o ter pretendido, ou por ironia do destino, a concentração de riqueza, com as inerentes desigualdades, sendo um escândalo social e moral, um pouco à semelhança do que acontece com as medidas de austeridade, mas muito mais grave, não deixa de ser uma “bênção” para o planeta, para a necessidade de o salvar.
Vejamos. 
Se redistribuíssem amanhã a riqueza pelos que a não têm, o que é que aconteceria? 
Não digam que todos ficariam melhor e que haveria mais ricos, porque os efeitos seriam devastadores... para o planeta.
Os níveis de consumo, se não forem controlados, talvez sejam a maior ameaça para a humanidade.
Se ao menos fosse possível alcançar menos consumismo de bens materiais, desperdício, destruição, poluição, extinção de recursos, em troca de mais consumo de serviços... 
Mas este nó parece ser um nó górdio.

sábado, 26 de janeiro de 2019

Valores e escolhas


Haveria considerações e reparos a fazer, por exemplo, à redução dos valores a gostos, ou que os valores estão fora do domínio do conhecimento, mas o que mais me suscita interesse é que a questão dos valores é a questão do Direito, da justiça e da sabedoria, ou mais simplesmente, do critério, da escolha, da ciência das escolhas (como alguém define a economia), da responsabilidade, da liberdade... 
Na realidade, desde o átomo à galáxia, tudo, incluindo o conhecimento (e o conhecimento científico), vale ou não vale, de acordo com algum critério de valor. 
A questão do valor intrínseco é resolvida pelos crentes num Deus que ditou a tábua de valores absolutos. Os não crentes, ou, pelo menos, os que não têm outras referências religiosas, morais ou éticas, sendo eles próprios como que o centro de todas as referências valorativas, o Eu sem o qual nada vale, tenderão a gerir os valores como uma espécie de "mercado" mais ou menos perspetivado para o curto, médio ou longo prazo mas, indissociavelmente, de uma racionalidade utilitarista tendo o "big bang" como pano de fundo e a morte como fim. 
De qualquer modo, quando falamos em valores, quando consideramos, por exemplo, que a ciência é um valor, não estamos a falar de gostos ou preferências, ou vícios, mesmo que haja pessoas viciadas em ciência, como poderá haver pessoas viciadas em virtude. 
Do que estamos a falar é de algo que, no quadro das realidades que contam "propter nos homines et propter nostram salutem", todos têm facilidade em argumentar a favor e ninguém consegue (com sucesso) argumentar contra.