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terça-feira, 13 de junho de 2023

Ciência e Filosofia

É importante, mas sobretudo mentalmente excitante, 

perceber, 

através do pensamento dedutivo, 

tão característico do pensamento filosófico, 

que a ciência não se funda em deduções, mas em observações e constatações impossíveis de deduzir.

 

sexta-feira, 9 de junho de 2023

Entre ensinar e aprender

O que acontece entre ensinar e aprender é um problema de todo o tamanho. Mas ainda bem que acontece. Não creio que esse problema possa ocorrer, por exemplo, na IA.

Esse é um problema que se vai resolvendo, mas nem o conhecemos bem, nem temos à mão a solução. O que sabemos fazer é baseado na experiência, na observação e na tradição.

O facto de querermos colocar o foco todo num problema que, paradoxal e ironicamente, estamos longe de conhecer, é uma excelente desculpa para não pensarmos que eficiência pela eficiência não faz sentido. A eficiência, pelo menos na educação, só faz o sentido que cada um lhe quiser encontrar. É quando começamos a falar de educação a todo o custo, de disciplina e adestramento humano em função de valores mais altos, que começamos a esvaziar de sentido a educação e os valores.

O enigma do que devemos fazer não se resolve com uma resposta sobre aquilo que podemos fazer. Em tempos recuados, a humanidade logrou resolver esse enigma de um modo incrivelmente sofisticado, que foi o modo de acabar com as perguntas, dando uma resposta em vez de formular outra pergunta e proibindo o questionamento.

Se não questionássemos a realidade, e tantas vezes, de vários modos, e tanto tempo, o fazemos, a simplicidade das respostas e dos veredictos seria de tal modo confortante e divertida, que aceitaríamos como um dado, por exemplo, que há humanos estúpidos e humanos inteligentes, assim como damos quase como certo que somos mais inteligentes do que as outras espécies.

Se não questionássemos a realidade, seríamos estúpidos, sem sabermos que os humanos até podem ser inteligentes.

A inteligência só falta quando interrogamos, quando perguntamos, quando duvidamos. É pois natural que o não façamos, porque assim nos sentimos totalmente esclarecidos e satisfeitos. É talvez daquelas evidências de que os humanos estão mais desprovidos mas não menos convencidos, porque ela é como um foco e uma linguagem, na justa medida do que vê, do que diz e do que induz. Não chamemos a isso cegueira. De resto, dizer a um cego que é cego não o faz ver. É fundamental que aprendamos a respeitar o cego e o surdo e o mudo, porque ver não corresponde a ter visão.

É preciso e imprescindível fazer um percurso de aprendizagem daquilo que já se sabe há muito. Não basta, relativamente a um assunto, fornecer as conclusões, ou as sínteses, do mesmo modo que, para quem não sabe escrever, não basta mostrar as palavras escritas para ela ser capaz de escrever. No conhecimento, na aprendizagem, a apropriação das trivialidades é tão fundamental como se cada aprendizagem fosse uma invenção, de novo.

Vulgarmente, quando alguém se entusiasma, por exemplo, com ideias consabidas, como se as tivesse criado, ou porque as criou, embora elas já o tenham sido por outros, logo aparecem críticos enfastiados a desmerecer novos Sócrates e Platões, como se isso já não tivesse valor. Como se o facto de alguém pensar o que outros (até filósofos importantes) já pensaram, fosse menos importante por isso.

A educação como um produto que se pode comprar é algo que se integra na tendência actual dos poderes do dinheiro, à semelhança do que acontecia com certas bulas papais. A ideia e a percepção de que o dinheiro pode comprar a virtude (em sentido amplo) andam muito próximas da ilusão de que a droga transforma um farrapo num deus.

Há uma ilusão, tavez compreensível se considerarmos o processo de pensamento, de aspiração e de adaptação dos humanos, de que podemos saber sem aprender, valorizando até alguma espécie de saber, supostamente, inato, que anda próximo do conceito de talento natural. Se há algo com que os humanos sonham, e almejam alcançar sem esforço, é prodígios. São muito facilitadores e estão em linha com a lógica da eficiência económica. Até há quem acredite que a inteligência não sabe, e que ser inteligente é fazer sem saber.

O que poucos consideram interessante e prodigioso é aprender, observar, ler, mais do que ler um livro sobre “como observar pássaros”, observá-los, de preferência com aquele livro à mão. Mais do que escrever sobre o “espaço interior”, no cárcere, sobre o cárcere, manipulando palavras, como uma IA, observar, e descrever, porque a realidade é algo que não se pode meramente deduzir, como acontece com as fantasias, ad infinitum.

É muito importante centrar a educação nas aprendizagens como processo de realização e de envolvimento pessoal nos prazeres e nos trabalhos da vida.

E isto não é utópico. Está mais próximo das necessidades naturais do que transformar a educação numa linha de formação de mecânicos, por mais necessários que estes sejam.

Utópico é considerar que ensinar “2+2=4” é liberdade de ensinar.

quinta-feira, 25 de maio de 2023

Quando o sol desponta

Quando o sol desponta

na ponta da nave

eu vejo a água a separar

a ilusão da realidade

sinto a saudade a iluminar

o mar e o céu

com a verdade das gaivotas

de todos os tempos

de todos os mares

de todos os céus

de todos os mundos

que nunca serão meus.

sábado, 13 de maio de 2023

Problemas de cariz político, económico e social

Não reconheço qualquer vantagem no tipo de discurso alarmista, vago, pistoleiro, a disparar para todos os lados, pessimista, sem esperança, de impotência e catastrofista, apesar de se acomodar e de se prevenir com as cautelas e caldos de galinha do bom senso pedagógico e pacificador, que é sempre recomendável e, se bem não faz, mal também não.
A maior parte dos problemas de cariz político, económico e social, não são problemas para toda a gente e esse começa logo por ser talvez o maior problema, porque dificulta imenso, quer a abordagem e o reconhecimento dos problemas, quer as tentativas de os resolver. Do ponto de vista de um comentador, de um filósofo, de um sociólogo, o reconhecimento desses problemas como problemas objetivos, pouco ou nada adianta se ficar por generalidades, ou ideias ainda mais gerais sobre essas generalidades.
As coisas funcionam do modo como funcionam, porque as condições para isso estão criadas. Enquanto essas condições se mantiverem continuarão a funcionar. E não é por não gostarmos, ou não estarmos de acordo com essas realidades que elas passarão a ser outras, embora os descontentamentos, as manifestações, as oposições, as revoltas, as lutas, sejam germe e efeito de mudanças, que poderão ser de ruptura.
Normalmente as sociedades realizam algum equilíbrio entre "predadores" e "presas", como acontece na selva desintervencionada pelo homem. 
A nossa cultura é um desenvolvimento e aprofundamento desta relação "comercial" relativamente a mercadorias, sendo que o outro também entra nesta categoria de valores mercantis. Tudo estaria bem, em meu entender, como na selva, se todos pudessem ser predadores, tirar proveito, vigarizar, extorquir, ganhar, como o fazem as empresas que, nitidamente, nos sacam o dinheiro através dos mais sofisticados esquemas. Eu concordaria com esta alta e refinada cultura, em que as maiores inteligências investem desde sempre, se estivesse em situação ou posição de lhes fazer o mesmo. Isso seria a selva e seria bom. Mas estamos nos antípodas da selva e do mérito. 
O problema não é a sociedade baseada no mérito, é a sociedade não ter interesse no mérito, porque só interessa o resultado. Para se alcançar este também é preciso mérito, mas é um tipo de mérito de que ninguém tem coragem de se vangloriar, apesar de quase todos nós invejarem quem o tem: não é fazer batota, é fazer batota por algo que valha a pena sem ser apanhado. Existe uma ética clara em toda esta situação, só que imensa gente é doutrinada e educada para aqueles méritos que, na realidade, não lhes interessam, embora sejam preciosos para sustentarem o mérito dos que atingem os resultados. 
Posso ter o mérito de me preocupar com as questões éticas, de justiça social, de democracia, igualdade, mas não tenho o mérito de ser banqueiro que arrecada vantagens das suas habilidades, e muito trabalho, de estar em situação de deixar as questões éticas para o poder político e judicial, porque a ele talvez importe apenas gerir a realidade como ela se lhe apresenta: o dinheiro permite obter (não confundir com fazer) mais coisas do que qualquer outra coisa. 
Talvez um dia o dinheiro acabe e acabe a economia baseada no dinheiro. 
Admito que muitas das distorções da sociedade desapareceriam como por magia.

sábado, 6 de maio de 2023

Para sermos felizes


O pouco de que precisamos para sermos felizes depende de tanto e de tantas coisas, que preferíamos não ter de fazer, ou de enfrentar, que a felicidade acaba por ter, muitas vezes, um sabor amargo, como se fosse um presente envenenado.
Se é por isso que muitos de nós são lutadores, valentes ou valentões, mas neuróticos, essa espécie de heroísmo de si mesmos, à espera de uma taça que não existe, nem sequer alguma vez foi prometida, é um descalabro.
Quem tem coragem para reconhecer no espelho um idiota vítima da sua boa fé, ou da sua presunção de que os sonhos existem para serem realizados?

quinta-feira, 27 de abril de 2023

O que resta

Se estas ruínas

aliás belas

aliás monumentais

são o que resta

daquilo por que viveste

e por que tanto lutaste

com seriedade

que ao menos pudesses

ter tido a antevisão inefável

do que agora aos nossos olhos

é um desfecho desolador

de tantas vidas escarnecidas

hipotecadas à transcendência

daquele castelo mutilado

outrora altivo

e daquela igreja irreconhecível

outrora preservada

sem que ao menos

soubéssemos um pouco

da história de uma delas

podia ser até da mais humilde

das contingências de uma vida

vivida nestes penhascos

tão acabrunhados

podia ser até da última pessoa

a fechar os olhos à história

a toda a grandeza

de que não se ouve

sequer em memória

uma voz

sequer ilusória

a sair destas ruínas colossais

por onde agora só

alguma sombra de nuvem passa

e não deixa rasto.

 

sábado, 22 de abril de 2023

Não eram ilusões


Não eram ilusões

eram sonhos

necessidades bem reais

dores e angústias

frustrações de ideais

batalhas cruéis

fantasias

que podiam ser fatais

paixões que cortavam

visões carnais

que importavam tanto

por serem apostas totais

sem suspeitas de que aí

a sabedoria

não era mais.


sábado, 8 de abril de 2023

A poesia


No fim só

vi farrapos e não bandeiras

 

orações que agitei

a todos os deuses garantes

da minha ingenuidade

de os ter pela arreata

dos meus caprichos

 

foi isso que em sonhos

antegozava infantilmente

 

que mais dizer

daquilo que me fez sentir

a falta

do que menos tive

quanto mais desejei?

 

E como compreender

que gosto de ter sido o autor

desse mundo impossuído?

 

E como saber

(se o não sei)

porque fui banido

por tudo aquilo em que acreditei?

 

No fim

a poesia

é o único tecido

a adejar

minha companheira

de que faço bandeira

por o ter sido.